Uma pergunta tão simples, com no mínimo
duas respostas.
Automobilistas dirão que Interlagos
é um patrimônio histórico da cidade de São Paulo e por este motivo deve ser
mantido exatamente como está. E estão corretos no modo de pensar, Interlagos
realmente é um palco histórico do esporte a motor brasileiro.
O Prefeito, alguns políticos,
integrantes da sociedade podem dizer que Interlagos, enquanto propriedade,
pertence ao município, e de certa forma ao povo da cidade de São Paulo. E estão
corretos quando se referem a Interlagos apenas como propriedade.
Em ambos os casos, visto como “templo
histórico do automobilismo” ou como “latifúndio”, as duas partes se referem ao “povo”
como o real proprietário. Será?
Na hipótese de uma privatização
do terreno, ou no português claro, venda do terreno, que vantagens o povo da
cidade de São Paulo teria com isso? Claro que dependeria do tipo de
empreendimento que ali fosse construído, digamos que fosse um condomínio de
luxo, que vantagem o povo comum da regional de Jurubatuba teria? Nenhuma. Ponto
para o Automobilismo? Não.
Seja o que for que aconteça com o
Autódromo de Interlagos, o mesmo “povo” que as “autoridades” e os “automobilistas”
apontam como dono, seguirá sem ter acesso ao “seu” terreno.
Quantas pessoas que moram ao
redor de Interlagos tem acesso livre ao autódromo nos dias de hoje? Nos tempos
de Rubens Barrichello, cujos avós eram vizinhos do autódromo, pode até ser, mas
e hoje? Quantos meninos das comunidades vizinhas de Interlagos podem andar
livremente com suas bicicletas na pista?
O Automobilismo no Brasil, em
todas as regiões do país sempre foi marginalizado, no sentido de estar à margem
dos demais esportes, o automobilismo por ser esporte caro, sempre foi visto
pela grande maioria da sociedade como um esporte de rico, um esporte
inatingível, e o que o “Automobilismo” fez ao longo dos anos? Distanciou-se
ainda mais das pessoas, se fechou no seu mundo, se agarrou às conquistas já
obtidas, entre elas “autódromos”, títulos de nossos pilotos conquistados lá
fora, um herói nacional criado com vitorias num tempo onde o país era a cara da
derrota, um mito criado com a morte deste herói.
Hoje é fácil perceber que isto
não foi o suficiente, num país sem memória, é claro que mais cedo ou mais tarde
isso iria se acabar, mas enquanto a chama estava acesa, o que foi feito?
Onde está a aproximação do “público”
ou “povo” com o Esporte e com Interlagos?
Outro dia li um absurdo em tom autoritário
de um “automobilista” que reclamava de um evento de musica que aconteceria em
Interlagos.
Mas Interlagos não é do povo? Ou
é só do povo que acelera?
Interlagos é do povo? Ou só do
povo que privatiza?
Interlagos é do povo? Ou só de
quem pagar o preço que pedirão por ele?
Precisamos realmente de um Autódromo
aqui, um Sambódromo lá, uma cidade do Rock acolá? Não poderia estar tudo num só
lugar?
Dia desses perguntei a alguns
amigos do meio; E se o Maracanã fosse implodido para dar lugar a um condomínio?
A resposta desta pergunta é a
resposta para o que aconteceu em Jacarepaguá e o que está prestes a acontecer
com Interlagos. Ninguém está dando a mínima para o esporte do outro, vivemos no
país do futebol, onde 95% da mídia esportiva está voltada para este esporte e
os outros 5% dividido entre todos os demais.
O Autódromo de Interlagos desde
1940 vem ocupando um terreno de 960.000 m2 única e exclusivamente voltado para
a prática de uma única modalidade esportiva. Foi com esta mesmo linha de raciocínio
que acabaram convencendo a maioria da população do Rio de Janeiro, exceto os “automobilistas”,
de que para o bem de uma gama muito maior de modalidades esportivas,
justificaria a desativação de Jacarepaguá e construção do Parque Olímpico.
Não será novidade nenhuma se
durante uma consulta publica ou votação, a maioria esmagadora da população de
São Paulo, vote pela desativação do Autódromo. Afinal, para assistir a Formula
1 pela televisão, tanto faz se a pista é aqui ou em outro país.
É esta a proximidade que o povo, “dono”
do autódromo tem tido do seu “patrimônio”, vendo pela TV, e será a distancia
que o hoje “dono” de Interlagos, o povo, terá das luxuosas Torres e Shopping
Centers que ali se planeja construir.
Seja como autódromo ou como condomínio,
o “dono” estará sempre dos portões para fora. E não me venham dizer que
assistir algo da arquibancada é ter acesso a Interlagos. Assim como ver um jogo
da arquibancada não é jogar.
Automobilismo é esporte que não
se pratica, menos de 0,5% da população do país já sentou ao menos uma vez num
Kart, ao passo que crianças nascem jogando bola, e a comunidade do
Automobilismo, nada fez e nada fará para mudar isso.
Futebol, vôlei, tênis de mesa, ginástica,
natação e acreditem, até tênis pode ser praticado nas escolas, em ginásios municipais
e praças públicas, o automobilismo não.
O automobilismo, seus poucos praticantes,
gestores e até a própria mídia esportiva, se colocaram à margem de tudo, se
fecharam num mundo onde ver uma prova de ciclismo na “sua” pista era quase um
crime, infelizmente agora é um pouco tarde para tornar o automobilismo mais
popular, porem, talvez não seja tarde para manter Interlagos. Mas é preciso ideias,
projetos e nestes projetos incluir a participação do seu verdadeiro “dono”, o
povo, e nesta luta, quem tiver o “dono” ao seu lado, será bem sucedido.